A sociedade muda numa velocidade impressionante. Novas tecnologias são agregadas e todos têm que se adequar, impreterivelmente. São realidades até então inadmissíveis. De um momento para o outro: tcham, tcham, tcham… Se ontem a gente estava no “carbono”, hoje digite “enter” e imprima em tempo real.
Lá está a cópia tão desejada e fácil. Há quem diga “surreal”. Pronto: cópia e documento nas mãos. Até minha sobrinha reclama insatisfeita, com a demora em acessar determinado conteúdo: É no “you tube”, tio! É no “you tube”, tio! E olha que só tem três aninhos… É por isso que me encantam os escândalos que pipocam na política brasileira. Vivo extasiado quando leio que, foi “pego com as calças na mão” ou “dinheiro na cueca”, o deputado que usou indevidamente verba de gabinete, não declarou bens ao imposto de renda, recebeu “pixuleco” para isso ou aquilo, comprou votos em sua eleição, subornou e deixou-se subornar, corrompeu e foi corrompido, etc., etc., etc.
Começo a sonhar que as coisas podem mudar. É o velho ditado: “Deus escreve certo por linhas tortas”. De verdade, passo a acreditar mais no Brasil, na força da população brasileira. Passo a sentir que “o rei está ficando desmascarado” ou “desmascarado está”. E me deixar levar pela euforia: “o rei está nu…”. No aprendizado democrático a visão que estava completamente turva, os olhos que estavam tomados pela “catarata”, pela cegueira, começam a vicejar um Estado com estruturas que funcionem dentro do respeito à Norma Maior, às leis e a ética.
Um Estado, em que teremos condições de avançar, largando de vez a “máquina de escrever” do imobilismo cidadão e aderindo à velocidade dos “mega bytes” da decência e capacidade cognitiva para buscar uma nova ordem nacional. E sabem de uma coisa: o tempo não para! E, bem dentro desse tema fui participar da Conferência Nacional de Segurança Pública e Cidadania, no Centro de Convenções de Vitória, em nosso Estado do Espírito Santo, por sugestão do presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Estado do Espírito Santo. Que surpresa! Palestras sobre segurança pública e cidadania. Gente de todo o Brasil e representando vários segmentos sociais. Palestrantes do Brasil e do mundo.
Que maravilha viver, como diz o mestre Hélio Fernandes. Lá estavam mães que perderam seus filhos por ações truculentas de policiais, policiais vítimas de meliantes facínoras, mulheres vitimadas por maridos e companheiros, companheiros vitimados por esposas ou amásias, movimento negro, simpatizantes da causa gay, agentes de trânsito, guardas municipais, polícia militar, polícia federal, militares das forças armadas, servidores e públicos, agentes públicos e vítimas em situações diversas por ausência da presença proativa do Estado.
A curiosidade era grande: você trabalha em que órgão? Também é da segurança pública? Qual o movimento social a que pertence? De que estado? Entre tantas e tantas perguntas. Uma Conferência, guardadas evidentemente as proporções, que se assemelhava ao plenário das Organizações das Nações Unidas, onde transitam homens e mulheres de toda parte do planeta. O ponto alto da cidadania pode ser caracterizado pela presença de um lustre brasileiro. Negro, articulado, sem demérito ou preconceito algum aos brasileiros de todas as raças e gênero, produzia apartes insistentes, contudo pertinentes e acadêmicos. Exigia que a discussão envolvesse a transversalidade e a intersetorialidade. Mas o que é isso? Transversalidade e intersetorialidade, juntos! Aí, foi à gota d’água!
Se esgueirando daqui e dali, num exercício prático de articulação entre sujeitos de setores sociais diversos, mesmo que “sem querer querendo”, no dizer do personagem “Chaves”, daquele seriado de televisão, participantes foram se chegando e se aproximando daquele cidadão, dando vida a uma organização didática de integração entre todos. Acontecia ali, ao vivo, o exercício em essência, da transversalidade e intersetorialidade. Mas restava saber quem ou de onde partira a inspiração didática para uma prática acadêmica e democrática de valor extraordinário.
De um lado e de outro: “Gostei de seus apartes”. Sempre seguidos do: que acha da segurança pública? Resposta categórica: “não discuto segurança pública. Discuto política de segurança pública, dentro de um contexto de transversalidade e intersetorialidade”. Agora a Conferência entrava em polvorosa! Diante de órgãos e órgãos, instituições e instituições, a que setor da segurança pública ou atividade de cidadania pertenceria aquele moço? Resposta: “não pertenço a nada, sou apenas um brasileiro”.
E quem é você? “Sou Tião, o cidadão”.
Agora a Conferência atingia o nirvana, o cerne, a cidadania, a democracia participativa, cumprindo seu objetivo, graças a Tião. Mas que Tião? Simplesmente, Tião, o cidadão.
Gilberto Clementino dos Santos
Crônica política
Com base no original publicado no Sindicato dos Policiais Federais do Espírito Santo – SINPEF/ES, em 24.06.2010.