“Acabo sancionar a lei da extinção da escravidão. Abraço Papae com a efusão do meu coração. Muito contentes” (Princesa Isabel)
Não estamos no dia 13 de maio de 1888, evidentemente, mas no mês de novembro de 2015. Entretanto, continuamos tratando, historicamente, do que representou aquela data, num país que hoje, possui 51% da população formada por negros, conforme banco de dados do “Observatório da População Negra”. O que foi feito após a assinatura da Lei Áurea? O que se fez em relação à população negra desempregada? E em relação à cultura escravocrata e racista? Enfim, o que faltou para consolidar a libertação?
E dentro de registros importantes, em vários meses de novembro, podemos enumerar fatos para a memória nacional. Sendo assim, em função de tanta perda de credibilidade e confiabilidade dos políticos e inércia dos poderes públicos, que apenas geram problemas e não soluções brotam indagações sobre o que aconteceu com a população e os destinos do país. Como chegamos ao ponto de imensa algazarra institucional, perpetrada por irresponsáveis e inimigos da Pátria.
No dia 14 de novembro de 1921 faleceu na França uma importante brasileira reconhecida por todos e, principalmente pelos escravos, como “a Redentora”. Seu nome as crianças aprendem logo nos primeiros contatos com os livros de história do Brasil. Na cultura ocidental, quando morre um amigo, parente, ou pessoa ilustre, não se espera festejo. A dor vem acompanhada de lágrimas e um sofrimento que parece não passar. De fato, é lugar comum, a assertiva de que apenas o tempo se incumbe de suavizar o sofrimento, mas nunca estancá-lo. Não é aceitável celebração de falecimento de ente querido ou personagem que teve presença marcante e contribuiu de alguma forma para a melhoria de condições de vida das pessoas ou compartilhou alegrias e sofrimentos durante sua vida. As exéquias são sempre frias.
Comemora-se sim, com muita diversão, data de seus nascimentos, oportunidade em que “rufem os tambores” e aparecem bolos confeitados, bebidas, comidas, velinhas acesas, para recebem sopros de vibrantes pulmões, enquanto o aniversariante se deleita entre convidados.
Nascimento e morte. Guardadas as tradições Ocidentais e Orientais fico pela importância de ambos. Podemos lembrar e comemorar não apenas o nascimento, mas, também, o falecimento. Comemorar o dia em que partiu da coabitação alguém que contribuiu de alguma forma para a melhoria das condições humanas e compreensão da vida individual e coletiva, indagando, se partiu sereno e tranquilo, tendo cumprido dignamente seu dever.
Voltemos à Princesa. Em visita ao Paço Imperial, no Rio de Janeiro, perguntei a um segurança sobre ausência de mobília nos espaços do palácio administrativo e, incomodou-me sobremodo, estar determinada sala de acontecimento histórico esvaziada de móveis. Refiro-me à sala onde a Princesa Isabel, em 13 de maio de 1888, assinou a Lei Áurea. Certamente, o fez da sacada do Paço Imperial, em ampla janela, quando teria acenado para a multidão e mostrado o documento assinado com pena de ouro. A população, em êxtase, comemorou algo fundamental para o ser humano: sua liberdade, com o fim da escravatura no Brasil.
Era um tempo importante para o país no plano internacional. O Brasil se enquadrava, de modo global, como uma potência. E antes mesmo da libertação definitiva da escravidão, tendo assumido o trono do Brasil em três momentos, a princesa Imperial assinara a Lei do Ventre Livre (1871), que estabeleceu liberdade aos filhos de escravos nascidos daquela data adiante. Ou seja, sempre avançando, mesmo diante de parlamentares e grandes proprietários de latifúndios sempre contrários e apoiados por um Partido Republicano que nunca teve em seu programa um item de pauta, onde se verifique a bandeira pela liberdade dos escravos.
A família Imperial enfrentou oposição interna e externa sobre o fim da escravidão, colocando em perigo um regime de governo, que em um ano e pouco (seguinte) seria apeado do poder pelos republicanos e a família real forçada a um exílio. Mas, voltemos à princesa: nasceu no Paço de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, em 29 de julho de 1846, após exílio, a Princesa, filha de Dom Pedro II, faleceu a 14 de novembro de 1921, no Castelo d’Eu, França. Seu nome completo: Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bragança e Bourbon. Seus restos mortais foram transladados em 6 de julho de 1953 para o Rio de Janeiro, juntamente com os de seu marido, o Conde D’Eu, para o Mausoléu da Catedral de Petrópolis.
A retrospectiva histórica sobre a Princesa e seu pai Dom Pedro II é importante para os brasileiros, principalmente nos dias de hoje, onde não existe grandeza pública, não se tem por parte dos parlamentares respeito aos clamores das ruas, ao sofrimento dos trabalhadores, principalmente os mais desprotegidos. Todos olhando para seu próprio umbigo. Estamos num tempo em que ninguém abre mão de nada, como no dizer do presidente republicano “maluco” Jânio Quadros: “ninguém renuncia nem mesmo a ser varredor de quarteirão” ou, de um anônimo “estamos numa situação de vaca não reconhecer bezerro”.
A família Real, o Imperador Dom Pedro II, poderia ter resistido aos “revoltosos”, ambiciosos, obcecados pelo poder. Certo é que detinha condições para tanto, mas refutou todas as hipóteses. Todavia, evitou o derramamento de sangue e saiu de cena com altivez, com a libertação dos escravos pela Princesa Isabel, mantendo o país com sua dimensão continental, respeitado no mundo conhecido, mesmo que isso tenha lhes custado o Regime Monárquico.
Gilberto Clementino
Análise Política