Jair Bolsonaro dá sinais de que começa a reconciliar-se consigo mesmo. O presidente belicoso, que investia contra os demais poderes e participava de manifestações hostis à democracia, deu lugar nos últimos cinco meses ao presidente mais contido, menos falante, mais respeitador dos ritos e menos imprevisível.
Acontece que a versão paz e amor de Bolsonaro contrariava sua real natureza e lhe cobrava redobrado esforço para parecer com o que não é e nunca foi. Então, eis que, de repente, voltou a aflorar o velho capitão afastado do Exército por indisciplina que não sabe viver a não ser trocando tiros e desatando crises.
Na última segunda-feira, para opor-se ao governador paulista João Doria que defende a obrigatoriedade da vacina contra a Covid-19, Bolsonaro subiu nos tamancos e defendeu o contrário. Nada melhor para Doria do que polarizar com ele. É Doria que precisa crescer nas pesquisas para enfrentar Bolsonaro em 2022.
Na quarta-feira, Bolsonaro anunciou que a vacina chinesa não será comprada. Passou a mão na bunda do ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello, que havia dito que ela seria comprada. Pazuello ainda foi forçado a gravar um vídeo humilhante onde afirmou que manda quem pode, obedece quem tem juízo.
E tudo isso para quê? Para nada. Para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, um dia depois, liberasse a importação de 6 milhões de doses da vacina chinesa, e o ministro Luiz Fux viesse a público dizer que caberá ao Supremo Tribunal Federal decidir sobre os os pré-requisitos para se adotar uma vacina.
Finalmente, com o consentimento de Bolsonaro e o estímulo dos três pivetes zero, o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, atacou seu colega Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria do Governo, chamando-o nas redes sociais de Maria Fofoca. Se virar moda passar mão na bunda de general onde iremos parar?
Salles é um projeto de malandro, que nada entende do que faz ou desfaz, aspirante a suceder Abraham Weintraub, ex-ministro da Educação, como porta-voz da ala ideológica do (des)governo Bolsonaro. Partiu para confrontar Ramos por achar que ele, ao lado de outros militares, quer derrubá-lo.
Não faria isso se não soubesse que é mais um precioso serviço que presta à familícia e a líderes do Centrão interessados no cargo de Ramos, articulador político do governo. Uma das atribuições de Ramos é controlar o pagamento de emendas ao Orçamento da União. Dinheiro na veia de deputados e senadores.
Se Maria Fofoca cair, será só mais uma baixa na guerra travada desde o início do (des)governo Bolsonaro entre os fardados e os radicais ideológicos. A primeira vítima foi o ministro Gustavo Bebianno, que já morreu. A segunda, o general e ministro Santos Cruz. O gabinete do ódio segue positivo e operante.