Juiz critica a PM, solta presos com 133 kg de droga e vira debate no TJ-SP

Virou um dos principais assuntos nos bastidores da Justiça de São Paulo a prisão, a posterior soltura e a nova ordem de prisão de três pessoas que foram inicialmente detidas com 133 quilos de maconha no fim da noite de sexta-feira, 23. O trio foi preso depois de ser abordado pela Polícia Militar em um posto de gasolina na Rodovia Marechal Rondon, em Guararapes, interior de São Paulo. Policiais alegaram à Justiça que desconfiaram do “nervosismo” do grupo e que, por isso, fizeram uma busca no veículo e encontraram a droga escondida no estofamento, no carpete e em malas. Longe de ser tratado como mais um flagrante de tráfico de drogas, o caso acendeu um debate nos corredores do Tribunal de Justiça sobre garantias constitucionais, porque um juiz plantonista avaliou que a busca e a prisão foram ilegais, e, por isso, determinou a soltura do trio. Nesta terça-feira, 27, um desembargador criticou os argumentos do juiz e determinou nova prisão dos três suspeitos, que já foram novamente detidos.

O homem e as duas mulheres tinham sido libertados pelo juiz Marcílio Moreira de Castro, plantonista do fim de semana na comarca de Araçatuba. Na ordem de soltura, ele argumentou que a PM não poderia ter feito buscas no veículo sem que tivesse um mandado judicial ou sem que os policiais apontassem “fundada suspeita”. O juiz criticou a “suspeita” citada pelos policiais, de que teriam percebido “certo grau de nervosismo” ao abordar o trio. “Os policiais não esclareceram em que consistiria o suposto ‘grau de nervosismo’. Sequer informaram se haveria muito ou pouco nervosismo. Apenas um genérico ‘certo grau’ de nervosismo. O veículo abordado havia simplesmente adentrado em posto de gasolina às margens de rodovia movimentada. Não há nada de ilegal ou suspeito nisso. Não consta nos autos que o motorista do Fiat Uno abordado tenha praticado qualquer infração de trânsito”, escreveu.

Quando foram presos, os três adultos viajavam no carro com um bebê de três meses e uma criança de 1 ano e 10 meses, que foram encaminhados ao Conselho Tutelar.  O juiz também questionou a versão dos policiais de que “este modus operandi (simular família dentro do carro para transporte de drogas), é relativamente comum, acontecendo algumas vezes onde o traficante para dificultar/ludibriar a fiscalização, coloca crianças no carro simulando uma família em viagem”. “Tal afirmação preocupa sobremaneira este Juízo. Depreende-se das afirmações dos policiais que a Polícia Militar estaria abordando, ou seja, parando, realizando busca pessoal e revistando automóveis com famílias inteiras em seu interior, com fundamentos superficiais e tênues”.

Para o juiz, “não é dado à Polícia Militar parar aleatoriamente e de forma indiscriminada pessoas em via pública, por mínimos fundamentos, para buscar qualquer crime que venha a ser encontrado”. “Tal conduta policial, além de abusiva, é característica de regimes autoritários – e não de uma ordem democrática, constitucional e livre, como a adotada pela República Federativa do Brasil”, criticou o juiz na decisão que libertou o trio.

Recurso

Ao pedir nova prisão do grupo, a Promotoria argumentou que nem a defesa questionou a legitimidade da abordagem policial e que o homem confessou à polícia que receberia 15 mil reais para transportar a droga de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, até Ribeirão Preto, no interior paulista. As duas mulheres alegaram à polícia que não sabiam que havia drogas no veículo. “As circunstâncias demonstram um arraigado envolvimento dos investigados no meio criminoso”, disse o promotor Cláudio Rogério Ferreira.

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Na nova ordem de prisão, o desembargador Júlio Caio Farto Salles argumentou que o juiz de primeira instância ignorou o relato dos policiais militares de que havia um cheiro “insuportável” de maconha no veículo, percebido durante a abordagem, e também ignorou os depoimentos conflitantes do trio à polícia. O desembargador, considerado rigoroso, pontuou que não caberia ao juiz plantonista fazer uma análise “mais aprofundada” do caso. Farto Salles afirmou ainda que “a prevalecer o posicionamento objurgado” (do juiz de primeira instância), seria um “salvo-conduto a traficante”, que “poderia transportar entorpecentes livremente pelo Estado, imune a abordagens ou revistas policiais, mesmo depois de o agente público observar versões contraditórias passadas pelos ocupantes do carro, além do cheiro ‘insuportável’ de maconha antes reportado (peculiaridade também irracionalmente ignorada pelo magistrado) igualmente exigindo a pronta ação da Polícia Militar”.

 

 

 

 

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